Boris Casoy fala de cheque 'gigantesco' de Silvio Santos à pressão na Record e não descarta volta à TV
Jornalista tem agens marcantes por SBT, Record, Band e RedeTV! e relembra carreira em longa entrevista

Publicado em 04/06/2025 às 00:20
Boris Casoy está fora da televisão aberta desde 2020, mas não descarta um retorno. "Se ar um cavalo encilhado, eu posso até voltar", divertiu-se o jornalista que hoje comanda um noticiário no YouTube com 300 mil inscritos. Ele narra sua rotina que começa às 5h30 com a leitura dos jornais e revela que recebe pouco da plataforma a ponto de ter que pagar para trabalhar.
As afirmações foram feitas em entrevista ao NaTelinha em uma longa entrevista publicada no YouTube (vídeo ao fim da matéria) e que também aparece aqui em formato de texto. Boris Casoy é o segundo convidado de uma série de 20 entrevistas com personalidades que fizeram ou fazem a história da nossa TV neste mês que marca as duas décadas do site.
Com agens importantes por grandes emissoras do país, ele recorda como quando Silvio Santos (1930-2024) o tentou segurar fazendo um generoso cheque. Foram 12 horas de conversas no escritório do Homem do Baú. "Me fez um cheque que nunca vi na minha vida, gigantesco."
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Na Record, guarda boas recordações, ainda que seja a única TV que não voltaria a trabalhar. Demitido, a emissora negou a se pagar o que devia. Processou. Foram longos oito anos até que "na prorrogação" - como comparou ele -, houve um acordo proposto - e cumprido - pelo canal do bispo Edir Macedo.
Confira:
NaTelinha - Você já está há quase cinco anos na internet. Como você se avalia aqui dentro deste universo?
A minha experiência na internet é um fato de orgulho pra mim. Estou completando ciclos. Fiz rádio, jornal impresso, televisão e agora eu fecho com a internet. Se aparecer algum outro, eu vou tentar. Mas é muito interessante ter atravessado todos esses órgãos de imprensa. São experiências muito excitantes. E eu fico com uma convicção que a notícia e informação, e o jornalismo é o mesmo.
NaTelinha - Você está aqui no jornalismo diário no YouTube. Como você se organiza?
Eu não me organizo. Eu sobrevivo. Acordo às 5h30, tomo café da manhã lendo os jornais. É difícil eu ter que checar uma notícia porque a ideia do Jornal do Boris é comentar as primeiras páginas dos jornais. Me inspirei no jornalista Vicente Leporace que teve um programa na Rádio Bandeirantes chamado O Trabuco. Ele lia um jornal apenas que apreciava, que era o extinto Diário Popular, mas prefiro trabalhar com todos os jornais possíveis.
Dou uma lida nos jornais. Vou dormir informado. Vejo televisão, os principais noticiários até pra ter uma ideia visual do que está acontecendo. A informação mais profunda não está na televisão, está nos jornais. Não é uma questão de qualidade e sim de possibilidade técnica e de obviedade. A profundidade está na escrita e não na televisão.
Me preparo, vou fazendo anotações. Se necessário acordo alguém pra pegar uma informação melhor. Às 7h, chegam três auxiliares meus e são os três auxiliares meus e uma maquiadora que é a cozinheira aqui da minha casa. Ela que consegue me transformar em alguma coisa aceitável.
O jornal sai basicamente com as informações básicas ou algo que possa aparecer em qualquer site dos grandes jornais, inclusive na Folha e UOL, que leio com muita atenção. E o jornal vai se amalgamando, vai se formando no improviso, sem esquecer que eu planejei e anotei as matérias indispensáveis pra constarem no jornal.
É simples, objetivo e direto. Eu erro às vezes e tem essa possibilidade de voltar atrás. Procuro fazer um diálogo. Me sinto à vontade. E há uma vantagem: estou muito mais próximo dos jornais brasileiros que das emissoras de rádio e TV. Hoje, você sabe, as emissoras de rádio e TV estão contaminadas pelos interesses econômicos.
Há uma crise na imprensa em geral, especialmente na televisão e no rádio. Esses órgãos se nutrem muitas vezes das verbas públicas e federais, estaduais e municipais. Isso contamina esses órgãos com alguns compromissos que nem sempre são percebidos pela maioria dos telespectadores.
O Jornal do Boris não aceita publicidade estatal. Não há possibilidade.
NaTelinha - Já houve oferta?
Não houve oferta. Acho que as pessoas sabem quem aceita e quem não aceita. Se houver, não será bem recebida. Claro que com toda a educação.
NaTelinha - Nesse 2025 efervescente você não se furta em mexer em alguns vespeiros. O que você fala na internet hoje, poderia falar na televisão?
Absolutamente não. E eu procuro mostrar. Se você acompanhar, procuro mostrar para o meu espectador essa diferença que a gente consegue fazer dos grilhões que a televisão possui. Eu trabalhei em praticamente em três emissoras sem qualquer intervenção.
Na Band, SBT e Rede Record, eu tive absoluta total e completa liberdade. Comandei o jornal e a opinião. Na Record, isso era estabelecido em contrato. Na Band e SBT, isso era um acerto verbal, e sempre foi cumprido.
Em determinados momentos, houve apertos. Na RedeTV!, trabalhei no começo com liberdade e depois a RedeTV! se relacionava com o governo Bolsonaro e aí sempre vieram... Não vou chamar de pressões, vieram tentativas de relações públicas... Na Record houve pressões. Enquanto eu estive na Record, realmente todos os dias nossos acordos foram respeitados. Foram religiosamente respeitados.
NaTelinha - E a pressão vinha de onde, no caso da Record?
Dos governos. Vou evitar citar nomes. Muitas pessoas já se foram e outras ainda estão aí. Por essas duas razões. Vou narrar um caso.
Primeiro caso, o Banestado: por ele, fluía um canal de transmissão e recepção do governo de dinheiros que iam e voltavam do exterior. Era um canal oficial, direitinho e tal. E aí, estoura um escândalo porque circularam verbas não identificadas. E nós começamos a cobrir essas irregularidades. E aí na cobertura nós sentimos que era algo interessante.
Nem aparecia sensivelmente na imprensa. Se viu que existia uma penca de irregularidades. Eu ei a cobrir o Banestado e começamos a receber pedidos para, enfim, flexibilizar... O que eu realmente não aceitei. A Record me punha a par do que estava acontecendo. Não flexibilizamos. Levamos em frente.
Depois veio o assassinato do prefeito de Santo André. Aí fontes do PT pressionaram contra a cobertura. Não estou culpando o PT, mas o PT pressionou contra a cobertura. Vou mostrar a ponta do iceberg: o prefeito de Santo André era um dos poucos prefeitos que o PT possuía numa cidade rica e com grande orçamento. Celso Daniel é o nome dele. Enfim... Ele recebia comissões que se destinavam ao PT de obras do transporte público e etc. Essa história também foi contada pelos irmãos dele. Um teve que sair do país porque foi ameaçado. Esse dinheiro ia para as despesas do PT, inclusive de campanha. Não é só o PT que fez ou faz isso. É quase o costume. Se bem que é criminoso.
E realmente provocou uma reação muito forte para pararmos de cobrir o caso. Aí voltando à história, ele descobriu que esse dinheiro arrecadado... Ele não conseguia operar esse dinheiro. Era operado por um grupo que acabou completando cujo destino ilegal era o PT e ou a usar para puro interesse próprio. Então, o prefeito acabou descobrindo. Dentro desse quadro, acabou sendo eliminado.
NaTelinha - Mas essas pressões da Record tiveram a ver com sua saída? Na época, houve notícias que você não queria dividir a bancada do jornal com uma mulher. Foi isso ou não? O que tem de verdade?
Não quis realmente. Era um jornal de âncora que era baseado em um jornal da televisão americana e não cabia duas pessoas apresentando. Você acha que em um contrato como o que eu tinha, de boa remuneração, com um prestígio que gozava o Jornal da Record na época, acha que o motivo de romper o contrato foi apenas o fato de eu ter recusado a mudança do formato do jornal?
NaTelinha - Acho que não...
Eu fiz com prazer aquele jornal. E eu podia recusar. Podia recusar por contrato. Não lembro exatamente, mas eu podia recusar. O fato foi o seguinte: isso me foi colocado... Você sabe que a Igreja Universal, não tenho nada contra a igreja que comanda a TV Record, tem diversas tendências lá dentro. Pelo menos tinha.
Eu já tinha sido advertido e a Record caminhava para um acordo com o Lula. E até então, o líder máximo da Igreja Universal, o bispo Edir Macedo, o chamava de Satanás. Houve uma aproximação e segundo me revelavam, permitia um apoio do PT a candidatura de um membro da Igreja à Prefeitura do Rio e tal. Na verdade, ninguém me pressionou ou deixar de fazer. Se tornava muito difícil chegar pra mim e dizer: 'Olha, apoia fulano, apoia ciclano'. Me tornei uma pedra no caminho dos anseios políticos da Igreja Universal. Me disseram: 'Você está na marca do pênalti'. E as coisas acabaram acontecendo.
Me chamaram, me demitiram. Foi um episódio muito ruim. Foi o único episódio verdadeiramente ruim que eu tive na Record. De maneira inábil, vou reduzir a história: ela quis negociar e não quis pagar o que ela me devia. Processei a Record. Demorou oito anos. Não ganhei o processo porque na prorrogação houve um acordo que a Record cumpriu religiosamente.
É essa a história. Você não vai imaginar: 'Ele não quis a dividir a bancada'. É muita ingenuidade acreditar nisso. Não tem anjo nessa história. Nem eu!
NaTelinha - A diferença dos jornais que você ancorava na TV e agora na internet é a resposta imediata do público. Você tem haters? Responde os haters?
Não respondo. Tenho vontade. Às vezes leio, às vezes não leio. Quando eu fazia o TJ Brasil no SBT, o Silvio Santos me viu lendo um monte de cartas. Eu recebia uma média de 40 por semana. Ele dizia que era bobagem. 'Você se contamina, para de ler!'. Era assim. 10 cartas eram sérias, as outras 'eu quero que você me dê um caminhão', 'quero namorar com o senhor', de várias partes do Brasil.
Achava democrático ler e tal. Quando vem uma coisa séria eu respondo. Não vou responder ataques. Eu fiz um grupo de amigos pequenos, que me assessoravam. Por exemplo: tinha uma professora de Santa Catarina que me telefonou pra corrigir o meu português. Ela havia sido professora do Ensino Médio. Quando eu tinha uma dúvida, ligava pra ela. Quando tinha um erro, ela me corrigia.
Tinha um senhor da sua região, ligado a Ribeirão Preto, que havia sido presidente de uma estrada de ferro, que conhecia o problema ferroviário e viário do Brasil. Necessidades, sistemas, participou de construção, também me fazia assessorar por essas pessoas. Um médico da minha confiança... O aprofundamento que eu tinha era com esse grupo. Quase todos aposentados.
Isso é uma coisa que eu não lembro de ter contado, mas foi extremamente satisfatória e prazerosa de lidar com esse pessoal. De graça!
NaTelinha - Tinha uma professora à sua disposição, então?
Praticamente! Me ensinou muita coisa.
Queria fazer um hiato: quando fui editor da Folha, encontrei a primeira pessoa a comentar televisão no Brasil. Foi a Helena Silveira. Vocês do NaTelinha são sucessoras da Helena Silveira. Era uma mulher culta de uma família culta, o pai dela tinha sido diplomata. Ela tinha romances que escrevia... Foi a primeira seção de TV da imprensa brasileira. Queria homenageá-la nesta entrevista. Era uma figura muito interessante. Tinha um texto brilhante. Era uma visão diferente dada pela visão do NaTelinha. Onde quer que ele esteja, minhas melhores homenagens nesse momento de um site que chega aos 20 anos. Deve ter alguma razão. Acho que é qualidade baseada em fazer um bom conteúdo.
Vocês têm uma repercussão imensa. Eu me curvo e respeito. 20 anos é muito tempo. E eu fui colunista da Folha. Fazia o , uma coluna que eu adorava fazer. Está nas minhas melhores memórias.
NaTelinha - A gente que se curva! Obrigado, Boris. Queria saber se houve alguma dificuldade na internet sem ser as técnicas? Quais foram os tipos de dificuldade que você foi encontrando?
Sou um usuário básico da internet. Eu consigo ligar o computador, ler, mudar e buscar os canais. De vez em quando aparece um pequeno problema e eu resolvo. Mas tenho uma pequena equipe de auxiliares que conhecem melhor a computação e que me dão um jeito. Não sou nenhum expert. Não sei como funciona. Sou curioso. Gosto de computação, mas pra por a mão na massa... Mas não sou um ignorante completo! Tenho preocupações com a internet como veículo. Acompanho a questão do regulamenta, não regulamenta. É um veículo importantíssimo, mudou o Brasil para pior e melhor.
Mudou politicamente o Brasil. Mas eu me dei bem com a internet. A notícia é a mesma. Os princípios de um bom jornalismo são os mesmos. Não tem diferença. Mudam os veículos. Tem que perder a timidez, nervosismo, mas a essência do jornalismo é a mesma. A mesma essência do NaTelinha é a essência do jornalismo.
NaTelinha - Está com saudade da TV?
Não tenho saudade e tenho saudade de todos. Cada um deles me deu um prazer. Sempre gostei de rádio, tenho grande amor pelo rádio. E está se aproximando muito da televisão. Me apaixonei pelo jornal, pela televisão. Se ar um cavalo encilhado, eu posso até voltar.
Acho que já ei da idade e tudo isso. Mas se me aparecer, agora vai ser difícil eu aparecer. Porque realmente na maior parte dos casos você precisa no mínimo... Eu cheguei num ponto que não vou me submeter a apoiar esse ou aquele candidato. Tento fazer um jornalismo esclarecedor. Sou um ser humano, tenho minhas preferências, mas procuro sufocá-lo em benefício do meu espectador.
Esses quatro veículos me dão um enorme prazer. Tenho saudades de todos.
NaTelinha - Você esteve no documentário da Hebe Camargo no +SBT e colaborou bastante. Não sabia que você tinha uma relação tão próxima com ela. Qual era o nível de amizade vocês?
Ela fazia o programa dela não nos estúdios do SBT, ela fazia no auditório, ficava na Ataliba Leonel. No mesmo auditório que do Silvio, mas ela frequentava a produção dela que ficava na Vila Guilherme. Eu já tinha uma iração por ela, acompanhava quando era cantora... Fui um grande ouvinte de rádio e ela se aproximou.
Eu telefonava, ela me telefonava. Não vá pensar qualquer outra coisa que é bobagem...
NaTelinha - Eu não estou pensando nada! (risos)
Tô dizendo pro telespectador, eu sei que você não está pensando nada (risos). A Hebe era uma figura que no palco e na vida, ela era a mesma pessoa. A Hebe me telefonava, se interessava como se interessava por outras pessoas. Ela era, e falo com a maior tranquilidade: um ser humano diferenciado. Alguém que se fazia gostar. Alguém que não interpretava no palco e nem na vida. Tinha uma grande iração pela Hebe, fora a profissional. Ela conseguiu se adaptar, foi cantora, foi mudando a programação, se adaptando... E sempre esteve no topo! Tinha uma grande iração.
A amizade foi uma aproximação... Ela gostava de mim, eu gostava dela. A gente conversava bastante. É uma figura maravilhosa e eu considero uma das figuras mais marcantes desses 84 anos de vida, Hebe Camargo. Que Deus a tenha.
NaTelinha - Ela não tentou te segurar quando você foi pra Record?
Imagine... Ela era uma profissional. Sob esse aspecto de ligação, trabalhou na Band, Pan (rádio). Ela podia ter vínculos pessoais inclusos, mas era acima de tudo uma profissional. Pelo contrário, ela lamentou que não íamos nos ver tanto, mas não foi verdade porque continuamos nos encontrando. Quando fui pra Record a partir de uma proposta irrecusável. Eu subi profissionalmente.
O Silvio tentou me segurar. Eu já tinha assinado com a Record.
NaTelinha - Ofereceu mais do que você ia ganhar na Record?
Não! Ofereceu o mesmo. O Silvio era uma figura irável. E teve comigo duas conversas de aproximadamente 12 horas no escritório dele. Ficávamos tomando cafezinho e sanduíche. Ele tentou me convenceu a ficar.
No dia que me despedi do Silvio, era uma sexta e ainda estava no ar. Estive no escritório dele no Ibirapuera e me acompanhou até o carro. O carro tinha um estribo, colocou o pé, tirou um livro de cheques e me fez um cheque que nunca vi na minha vida, gigantesco.
'Aí está o período de quatro anos que você vai trabalhar para o bispo. Não sei o que o bispo pode te oferecer que eu não possa. Se você não me devolver o cheque até segunda, eu sei que você ficou. E segunda-feira você vai ao Salvador, que era um advogado do SBT. Você faz o contrato que você quiser'. E eu devolvi o cheque pra ele. 'Me comprometi e vou para a Record'. E ele permitiu que eu me despedisse dos meus telespectadores. E eu me despedi. Ele só pediu que eu não mencionasse pra onde eu ia. É raro, viu?
Eu fiquei com a melhor imagem. Continuamos conversando, enfim. Não saí brigado do SBT. E nem tenho rancores em relação à Record. Eu gosto, onde tive momentos prazerosos. Cumpriram... Fiz amigos até na Igreja Universal. Tenho um problema político que é o seguinte: é uma Igreja que almeja a presidência da República. Eu não quero participar dessa cruzada. Eu tenho essa dificuldade. Se você me perguntar: voltaria a trabalhar no SBT? Sim. Na Folha? Sim. Voltaria a trabalhar na RedeTV!? Sim, com todo o prazer. Na Record, não. Não porque eu odeio a igreja, porque eu iro coisas da igreja. A Igreja Universal e as pentecostais prestam um serviço ao país. Tem todo um trabalho de comunidade. Tenho até iração. Tem coisas muito interessantes. A parte política não me pergunte, porque senão vamos encerrar a entrevista (risos).
NaTelinha - Não queremos que você seja processado!
Aí você vai me visitar na cadeia (risos).
NaTelinha - Minha nossa! Não queremos isso. Mas antes de você sair do SBT você tinha um programa que estava sendo formatado chamado Linha de Fogo. A notícia era que o Silvio aumentou o próprio programa e minou o seu. É verdade?
Não, não. Qualquer programa que aumentou não era o dele. Era pra entrar às 22h. Os cenários estavam prontos, o primeiro entrevistado era o Lula. O Silvio chamou e disse: 'Olha, não vai entrar e não vamos fazer mais'. Não teve problema não. Não fizemos.
Se você me perguntar se eu me chateei, me chateei. O Silvio tinha essas surpresas. Ele tinha impulsos. Foi um episódio desagradável, mas não foi ofensivo. Ele era empresário, viu qualquer inconveniente... Não era político, era programação lá.
NaTelinha - Eu vi você no documentário do Silvio também onde você até fala que ele era um excelente patrão. Na época que ele se candidatou, você até discordou...
Eu não discordei. Eu critiquei a candidatura dele! Na televisão dele! Você imagina o desprendimento dele? Um contratado, vai pro ar e critica a candidatura dele. Critiquei com muita ênfase sem problema nenhum. Ele vendeu aquilo como um ato de democracia dele. Porque ele permitia até que um subordinado o criticasse na sua própria emissora. Ele transformou numa ação de marketing próprio.
NaTelinha - O Silvio não falou nada, ok. Mas alguns dos diretores dele não gostaram?
Não. Antes eu consultei a diretoria. Falei: 'Olha, eu como nesse prato, mas eu vou falar...'. Não queria perder o emprego também, né? Aí recebi a seguinte resposta do Guilherme Stoliar, executivo do SBT e sobrinho do Silvio: 'Você não combinou que você tinha liberdade total? Então faça o que você quiser'. E eu fiz!
NaTelinha - Depois da sua saída do SBT, o Silvio deu uma desanimada do jornalismo. Ele só foi voltar a investir em 2005 no departamento com a Ana Paula Padrão. O que aconteceu?
É difícil você definir com muita clareza a relação do Silvio com o jornalismo. Ele era uma figura muito multifacetada. O Silvio basicamente num determinado momento via o jornalismo como um programa como qualquer outro. E não tinha o compromisso com a notícia, crítica e informação que um jornalista deve ter.
Ele tinha uma visão de show. Não é que o Silvio não gostava do jornalismo. Ele via de maneira diferente. O jornal que ele gostava era o Aqui Agora, vibrante, gritando, trazendo um fato sensacional, emoção... Simpatia. Efeitos bombásticos, esse tipo de visão que ele tinha do jornalismo, que não era a visão que a gente pretendia.
Então, eu não sei o que aconteceu porque eu não estava mais lá, mas ele teve altos e baixos. Foi, voltou e ele, por exemplo num determinado momento, achou que podia melhorar o jornalismo colocando duas moças lindíssimas com pernas igualmente bonitas no ar. Não deu certo. Depois colocou um menino de 18 anos. Era uma visão muito diferente. Ele colocou o Maguila pra comentar economia.
Tenho uma boa memória do Maguila, convivia com ele no SBT e se fazia de tonto. Não era bobo não. Em um dos primeiros dias, ele disse 'o ministro da Fazenda que sobe os preços, é um filho da...'. E falou! É uma pessoa, o Maguila, que tenho uma boa memória, que tenho saudades.
NaTelinha - Mas não entendia de economia...
Era um cidadão comum. Ele criou um personagem. Mas nada daquilo. Era bem esperto. Essa era a visão mais popular em que eu posso até criticando, mais popularescas, do espetáculo. Não sou contra. Eu não faço, mas é um ramo perfeitamente aceitável. Eu não gosto de fazer, mas acho que bem feito, se eu tivesse uma emissora de televisão... Não teria um Aqui Agora.
Criou-se uma imagem que eu não gosto de noticiário policial. Bobagem.
NaTelinha - Tem muitos fazendo o mesmo programa na mesma hora, né?
Deu certo mais no começo. Perdeu um pouco o charme. Mas é um jornalismo digno. De vez em quando dou uma espiada, vejo como está. Acompanhei o caso daquela menina Vitória... E às vezes quero ver como é feito, helicóptero e tal.
NaTelinha - Não é algo que você consuma?
Não, não. Mas eu respeito as pessoas que fazem. Não tem essa de 'ah, ele não gosta'. É jornalismo.
NaTelinha - Que tipo de jornalismo você consome mais?
Eu vejo muita televisão aberta. O que eu vejo? Jogo de futebol. Comecei minha vida cobrindo esporte, gosto de futebol, gosto de vários esportes. Acompanho pela televisão. Sou palmeirense. Mas se tem um bom jogo e o Palmeiras tá ruim, mudo de canal.
Vejo filmes, um ou outro. E os noticiários. Todos! Todos... Todos ao mesmo tempo não dá. Tem coisas boas e até profissionalmente como eu leio jornal e não me vejo lendo criticamente. Esse é um problema.
Todo noticiário que eu vejo, me é interessante. Sou um telespectador comum, mas muito crítico. 'Isso não é assim, aqui tem um erro e tal'.
NaTelinha - Você fica cornetando o off, agem, dizendo que o repórter está segurando o microfone igual um sorvete?
É chato isso, mas não tem jeito. Vejo alguns colegas e falo: 'o que a idade faz com as pessoas...'.
NaTelinha - Pro bem e pro mal, né?
Geralmente é pro mal. Olho gente que trabalhou comigo... Vou fazer 70 anos de jornalismo. Muita gente envelheceu sob meus olhos. Não vejo ninguém que tenha melhorado não.
NaTelinha - Verdade?
Verdade. Envelhecer é um horror. Se o Lula quisesse ganhar a eleição, ele proibia a velhice. E tem o problema da proximidade do fim, da finitude do ser humano. Eu brinco com isso. Inclusive com a morte.
Não posso visitar três lugares em São Paulo: cemitério, jardim zoológico e hospício. Por quê? Não me deixam sair. Brinco pra ter alegria. A vida tem que ser usufruída. Por que eu não paro? Porque tenho prazer no que eu faço.
Atualmente, ganho pouco do YouTube. Estou pagando para fazer o jornal. Você acredita? Eu estou pagando.
NaTelinha - Eu acredito.
E pago com prazer. E gosto. Se eu parar, 'ear, vou pra praia...'. Eu enlouqueço e enlouqueço os circunstantes. Me empenho, chego animado. Só na segunda-feira que é um horror porque quase não tem notícia. Mas me dá muito prazer o que eu faço.
Nada mais gostoso que você trabalhar, ganhar a vida e trabalhar numa profissão que você gosta. E estou nessa profissão que eu gosto.
NaTelinha - Você acha que a televisão ainda é o grande veículo de comunicação de massa apesar de ser menos consumida?
A televisão mudou muito, mas ainda é... Ela disputa com a internet, está havendo uma convergência. O rádio está usando imagem também. Você tem o à televisão e os sites internacionais e acho difícil realizar, ter uma visão completa porque estamos no meio da transformação. Pra onde vai exatamente eu não sei. E não é só a televisão aberta. Os canais fechados, especializados, esportes, vão aparecendo coisas com a internet. São coisas novas. Se você me pergunta se a televisão é importante, sim. Grande parte da população brasileira não tem internet. E quem tem, nem sempre funciona bem.
É como a faca: serve pra cortar bolo de aniversário e para matar. Tem muita força ainda.
NaTelinha - Tem alguma maneira de evitar a fuga de público? O cara que vê o Jornal do Boris, está deixando de ver o Bom Dia Brasil.
Essa é a pergunta de 1 milhão de dólares e ninguém conseguiu resolver ainda. Existe uma tentativa de trazer o pessoal da internet pra televisão. Não está dando certo. Não tem experiência anterior. É como o que o Trump faz, não tem experiência anterior.
Com que experiência você vai se basear? Os diretores estão sendo chamados para resolver, tem um problema comercial. É a pergunta de 1 milhão de dólares. Se você tem alguma sugestão, podemos ganhar bastante dinheiro.
Acho que a poeira vai se assentar e as coisas vão acabar acontecendo. Na medida que você chega numa posição, o país já mudou. Tem coisas que a televisão tem sido usada, essas coisas dos jogos de azar...
A televisão está se curvando a esse tipo de jogo. Não gosto. É submeter um veículo como a televisão a um vício que só conduz a desgraça. Bilhões de reais sendo gasto pelas pessoas. Já tem muita coisa ruim.
NaTelinha - No futebol, dizem que sem as bets, quebraria, mas há cinco anos não tinha isso. Qual o caminho? Limitar ou proibir, como o cigarro?
Acho que tem que limitar. Pra manter a liberdade, para as pessoas poderem jogar. Não dá pra fiscalizar. Como saber o João que recebe do Bolsa Família vai jogar? Não existe possibilidade de controle. Você reduz o chamado. Os anúncios são muito bonitos. Mulheres bonitas, roupas, automóveis... O mundo não é assim.
Acho isso ruim. E cria também na juventude uma certa frustração. Sempre tem o conjunto de fatores, objetos, que podem ser alcançados, que trabalhando fica difícil ter uma Ferrari, avião... Mas você tem um sonho, que eu chamo de pesadelo, nessas ofertas desses jogos. As TVs também estão fazendo os sorteios. Conseguiram do Bolsonaro e fazem pra arrecadar um pouco mais. Eu não gosto.
Eu reduziria a publicidade como o álcool teve a sua publicidade reduzida e devia ser mais reduzida ainda.